sábado, 2 de junho de 2012

Prosa: Um conto quase erótico (2005)






Um homem sai do seu quarto em direção à cozinha para beber água. Ao passar pela porta da sala, que está fechada, ouve um barulho. Ele para e, quando se preparava para abri-la, ouve a voz de sua filha:

- Não, Roberto, eu não posso.

O homem solta a maçaneta e se aproxima mais da porta para ouvir melhor. Percebe que a filha está acompanhada do namorado, Roberto.
- Ah, meu amor, você sabe que já tem muito tempo que te peço isso.

O homem quase morre. Pensa em entrar pela sala e agarrar o pescoço daquele projeto de tarado. Antes, porém, prefere esperar a atitude da filha.
- Não! Não! E não. Eu não posso e não vou fazer isso.

- Mas amor, não é nada de mais, ninguém vai ficar sabendo. Além do mais, já estamos juntos a mais de seis meses e eu acho que já fiz por merecer.

- Cruz credo, Roberto. Parece que isso é mais importante que o nosso amor.

- Pode não ser mais importante, mas se você deixar, eu vou entender como uma grande prova de amor.

- Não faz isso, paixão. Se eu deixasse, como olharia para o meu pai depois. Ele acabaria descobrindo e não me perdoaria nunca.

Nesse instante o homem, cheio de orgulho, se acalma. Pegaria aquele fedelho em outra hora. "Se eu o pegasse agora" -pensou - "minha filha poderia achar que não confio nela". Continuou ouvindo o dialogo do casal.
- Olha, venho aqui quase toda semana e ficamos aqui na sala, sozinhos. É muita tentação para um mortal ficar vendo tudo isso e não poder fazer nada.

- Mas ninguém ainda o fez, você sabe. Meu pai me fez prometer que não daria antes, mas depois do casamento...

- Isso não é justo! Todo dia fico olhando e imaginando que será hoje. Mas sempre você diz que não. Acho até que você não me ama mais.

- Claro que amo, Roberto.

- Então deixa. Só com a pontinha da língua. Só para sentir o gosto. Fico imaginando como deve ser bom...

- Para com isso, Roberto.

O homem, do outro lado da porta, pensa que, se não fosse a sua filha, era de se louvar a insistência do rapaz.

- Deixa pelo menos sentir o cheiro.

- Só cheirar ?

- Só.

- Você jura que não vai tentar fazer mais nada?

- Juro.

- Nem tentar dar uma lambidinha?

- Juro! Pode confiar em mim.

- Então espera. Vou abrir devagar e quando eu falar pronto você vem e cheira. Tudo bem?

- Claro, amor. Como você quiser.

- Pronto, não tente nenhuma gracinha...

Nessa hora o homem abre a porta e gritando “eu te mato, safado” , desacorda o rapaz com um soco certeiro. Ainda bufando olha para filha, sentada no sofá, assustada, segurando em uma mão a garrafa de Whisky que ele trouxe de sua viagem à Escócia e na outra sua tampa com o lacre rompido.


Cael Soares

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