terça-feira, 23 de maio de 2017

O trapezista



Queria ser na vida um equilibrista
Pender suavemente entre razão e emoção
Ter a estabilidade e confiança nos passo
E segurança da rede que me protege do chão

Mas o mundo assim me fez poeta
Vassalo do coração e irmão da tristeza
Sou o Corifeu desafinado da ode à alegria
E a nuvem que apaga as cores do arco-íris

Nada do que leio, ouço, bebo ou vejo
Dá-me a sensação de ser necessário
Sou aquele que está de malas prontas
Esperando o fim da ilusão para partir

Sou um trapezista de olhos vendados
Que se lança no ar em busca de outras mãos
Sabendo que outros trapézios estão vazios
E que não há redes que me proteja do chão

                                                           

Cael Soares

Tela: Waldemiro de Deus, "O trapezista"

segunda-feira, 22 de maio de 2017

Intervalo doloroso


Intervalo doloroso

Sou vassalo dos meus sentimentos
A razão há muito se escravizou
Os dias me doem como açoites
As noites como longos enforcamentos
Não tenho mais o sabor das cores
O mundo é monocromático em mim
Uma nuvem pousou na minha esperança
E meus sonhos nunca mais puderam voar
Estou na vida como um náufrago em mar aberto
As desilusões são ondas que arrebentam sobre mim
A fé foi uma boia que rapidamente se esvaziou
Os meus erros são uma âncora presa aos meus pés
A felicidade é um farol que desaparece no horizonte
Sei que de sua luz não é feito o meu caminho
Sou daqueles, que por cansaço, partem para escuridão
Sabendo que um dia todos serão esquecidos.
Cael Soares

Tela: "Tempestade", do pintor romântico britânico Wiliam Turner.

Se minha alma fosse uma pintura


Se minha alma fosse uma pintura
Seus traços seriam feitos por Gericault
Não tem o aprumo das formas de Ticiano
Nunca fui muito bom em equilíbrio e razão.

Minha alma foi um processo longo
Retorcimento constante de emoção
Deformação friamente construída
E a obscuridade de quem nasceu hermético.

O meu sofrer tem o silêncio de árvore
Que, os seus galhos, zéfiro esqueceu de soprar
Tronco marcado por inúmeras promessas de amor
E copa muito distante para poder alcançar.

Se a vida foi sempre outonos e invernos em mim
Se minhas folhas verdes perderam a cor é caíram
O meu último ato é o sacrifício de devolver à terra
Tudo o que inutilmente investiu em mim.
Cael Soares

Tela: "Um Náufrago", de Gericault.

Queria Ordenar ao meu tempo que pare



Queria Ordenar ao meu tempo que pare
Viver é um imenso tormento fora e dentro de mim
Minha alma não é do tamanho do que esperam que seja
Mas do tamanho de tudo que me faz sentir assim
Nas ruas por onde passo só vejo solidão e consumo
Corações despovoado de sentimentos, compras de liquidação
Uma velha canção tenta me encorajar dizendo "Hang on"
Mortos-vivos que caminham apressados em outra direção
Esse é o mundo para o qual não me preparei
Já tentei ser alegre, me encontrei como poeta banal
As palavras são materialização dos sentimentos
E sonho subir nos telhados e ser o violinista de Chagall
Cael Soares

Tela: O violinista, de Marc Chagall